quinta-feira, junho 11

O Velho Náufrago

Ao olhar para trás,
Os grãos que se agarram à base,
Colados com vales,
Invernos e Verões,
Cada um com a sua história,
Uma fotografia que se retém na pele,
Formando um álbum envelhecido.
Os olhos dilatam o tempo,
Ele dilata-se a ele próprio,
Ao regressar dos rubros verdes anos.

De mão dada com as tuas palavras,
De sabor jovial,
Sempre me senti embalado
No teu sopro aberto e bailante.
Eras o meu pulmão esquerdo,
O meu bom coração,
A segunda pele.

Até que um dia se espalhou pelo mundo,
Foi colorir de sonhos o teu existir.
O voo da alma,
Da tua alma.
Um longo Sem-Esquecer
Estendeu-se à minha porta,
À minha mesa,
No meu colo,
Nos pontos brilhantes dos meus olhos.

É que ontem, lá longe, olhei-me ao espelho
Escondido sob um manto engelhado.
E vi-te.
O teu sorriso no meu,
Pleno eu em ti,
Imagem e espírito partilhado,
Como sempre fui depois de te ser.
E se te sou ainda,
Como sei que sou,
Vou voltar a sê-lo contigo,
Agora que o tempo chegou!

Um grão que se despega da base.
A areia húmida, repleta de ouro seco,
Inunda a planta do pé.
(Trinta grãos de saudade.)
As tuas palavras lá ao fundo,
Tão perto que se inspiram.
Atrás as ondas guardam o caminho.
Lá à frente, uma cabana enterrada na praia.

Pauso finalmente o pé à tua porta.
Pauso.

Estou aqui, esculpido em madeira,
Vou crepitando a espera.
Alargo o encosto da porta
Que me leva consigo.

Perdida na brisa de uma janela estás tu.
Os olhos cedem.
Viras-te e os olhos cedem.
Toco-te e ficamos os dois.

Quero-te aqui comigo.

No nosso abraço somos erodidos pelo tempo
Somos lavados pela água salgada,
E semeados à beira-mar.
Os nossos troncos, troncos de palmeiras,
Sobem até às pontas das folhas.
Vem o vento,
Toco-te, e ficamos os dois.

sexta-feira, março 27

Não me lembro do teu sentir,
não preciso de lembrar,
tenho-o a cada segundo que passa.
Vivo em ti,
a tua força em mim,
os teus sentidos guardados aqui,
onde sou.
Seguro no peito a tua cara,
perto do amor que te é,
ele vive em ti,
e guarda por ti tudo aquilo que me dás.
E baixinho,
enquanto dormes em mim,
te diz:
"Sou teu"