domingo, abril 29

Prensa

Puxo a alavanca.
Rotação desenfreada, em tom de metal gelado. Foge um click por dente, um dente por grau, grau a grau até ao giro, sem soltar descoordenação, o tempo perseguindo o seu próprio tempo, sempre a tempo.
Click, pêndulo revolucionário, instigação rebelde na luta pró-sistema, sem compreender o seu peso, irracionalizando o foco que o segura e o envolve.
Click, falsa partida, roeste o disparo e voltaste a roer... paraste a corrida, quebraste a mecânica na tua ausência de causa barra motivo, bloqueaste o criativo de um mundo perfeito sem te contentares!
Click...
Click...
Click...
Ao som do relógio, escutando o seu batimento cardíaco, puxo a alavanca e os fios desfazem os nós. Soltos no tempo, grau por dente, dente por click, amarro os ruídos oleados.
O mundo é perfeito outra vez.

segunda-feira, abril 23

A Voz do Sangue

Quando as ilusões fluíam,
Voando por vagos caminhos etéreos,
Constantemente sufocadas,
Presas... consumidas por mim,
Quebrava a futilidade de um futuro imponente...
Decadente... talvez dependente?

Vivo de reflexos do céu que ao meu lado permanece,
Não sou eu... Não existo aqui...
Convergi? Elevei-me? Talvez...
Procurando aquelas torrentes de ouro
Difusas num sangue que não o meu,
Incertas, subjectivas, plenas de certezas minhas.

A luz guiou-te,
O céu lá permaneceu...
Envolto na minha mente...
Sempre presente...

Desde então sinto o tempo...
Vagarosamente o meu corpo estilhaçando,
Globos plenos de sonhos formando...
Fugazes? Frágeis? Nunca concretos...
...mas libertos, para as torrentes fugindo.

E eu... sempre na realidade envolto,
Comprimido por incertezas e vazios,
Moldo futuros ocos, corroo a razão,
Pinto o sentido de uma verdade provável,
Mas para todo o sempre vulnerável.

quinta-feira, abril 19

Sem Rumo

Tu?
Pelo toque distorcido me feri,
Rejubilar...Que fraca percepção!
Paralela à frustração, à emancipação!
Ludibriar o sopro que senti,
Sem manchar o mundo que previ
Não passa de abstracção!
Falas sem razão
Que premeiam a solidão...!

Não, não penso...
Porque não quero existir,
Não quero viver
Enquanto projecção prestes a esvair!
Não quero morrer!
Não quero esquecer e partir...!
Apenas desejo ficar,
Ser guiado pela indiferença,
Fugir por um caminho sem crença,
Pois a realidade é incompreensível,
Ela transfigura o previsível.

Irónico...estas mesmas palavras
São as lanças que me trespassaram...
E que por lá ficaram,
Cravadas no cimento,
Perpetuadas pelo tempo.

Mas chega de pensamentos!
Chega deste imparável sofrimento!
Suplico...! Cessa de uma vez!
Mas o que é que tu não vês?
Sim, invisível... Porém existo!
... E também me via...
Porque de sentir eu agora abdico...!
E se estas palavras são ocas,
Que não sejam no futuro...
Na vida que procuro.

...Não prossigo...
...Não consigo...
Se ao menos não estivesse contigo...
Se ao menos não te tivesse ao meu lado...
Falo de ti contrariedade...!
O verdadeiro inimigo da minha liberdade!
O factor que, mais forte, prevaleceu...
E quem acabou por preterir a realidade?

Esse fantasma...fui eu...

domingo, abril 15

Wonderland



"
American McGee's Alice,the Third Person Shooter computer game released in October 2000. Set years after Alice's Adventures in Wonderland and Through the Looking-Glass, Alice features an older, more cynical and macabre incarnation of Alice.

Shortly after her second adventure, Alice's parents are killed in a fire of which she is the only survivor. Driven catatonic and having attempted suicide (as found in the case book), she is institutionalised in Rutledge Asylum. Years later, She is called by the White Rabbit to the aid of a radically altered Wonderland now under the despotic rule of the Queen of Hearts. The Cheshire Cat in particular now looks very different from Sir John Tenniel's original illustration: the cat is shown here as skeletally thin and his grin looks more devious than mischievous. The Cat is Alice's constant companion throughout the game, popping up now and again to guide or offer advice.
In the end, Alice defeates the Queen of Hearts (her guilt) and restores Wonderland (her sanity) to its original form. Thus, she overcomes the madness that's been drowning her since the fire. Alice finally leaving the Asylum.
"


sexta-feira, abril 13

Gerbera

A calçada corria pelas minhas plantas naquele momento especial. Enquanto os mil braços solares cortavam o vale, imaginei-me algures, quis-me imaginar ali, a perder-me no foco sorridente de mim mesmo.

Nunca precisei de justificar..! Que felicidade! A calçada corria pelas minhas plantas no momento em que rasgo o pudor. Era a semente de algo celestial, regada uma e outra vez pelo privilégio de poder amar. Na crua nudez da corrida, molho a pele no sol, que me abraça e me pousa nas pétalas da gerbera... e foi nas suas asas que encontrei sossego.

O mundo rodou, como havia rodado, e um feixe de calor rodou com ele.

quinta-feira, abril 12

Vontade Profunda

Não sei...
Já me questionaram,
Essas vozes rebeldes do universo.
Não soube responder...
Não soube entender...

E sofri,
Com a possibilidade de poder relembrar,
Voltar a sentir a podridão que nunca senti.
Pois que seja! Pois que surja!
Que venham em plumas pesadas!
Que se abatem sobre nós
Contaminando os nossos sonhos!

...Imperadores modernos...
Amam a vida,
E por isso o mundo amam.
Mas não basta amar o mundo
Para que ele se entregue a nós,
É preciso conquistá-lo.

Fiz um trato com o sangue,
Que ele não afogasse a sanidade,
Que ele não te visse
Como o fruto de uma verdade...
Mas é do sangue que se trata,
Esse imperador moderno,
Essa pluma pesada,
Essa voz rebelde do universo!
Que teima em existir,
Que teima em perverter
A minha mente juvenil...
Juvenil?... Não enganes o tempo,
Engana-te a ti próprio!
Abraça a triste imagem que te rodeia
Erradicando as dúvidas que de lá advêm.

Não me perguntes porquê,
Não vale a pena descansar,
Não vale a pena continuar.
Tudo por um nada perdido,
Um nevoeiro inerte alastrando pelo mar
Um vento campestre atingindo o limiar.

Porém é belo o mundo...
É bela a futilidade inexplicável da vida...
É inspiradora, à sua maneira,
A essência do teu olhar pouco profundo...
Isento do sonho de quem te olha,
Fundido a outra íris ilusória.

E são tantas as histórias sorridas!
Imagens da debilidade adquirida...
...Que sangra pelos lábios d’uma asa partida...
São tantas...são tantas as fábulas!
Rótulos revoltados
De uma inexplicável soturnidade...
São imensas...infindáveis as folhas!
Tentativas supérfluas
De manipular a realidade...

Não chorarei à indeterminação,
Não ficarei envolto nesta densa confusão,
Sofrerei para sempre...
Degradado pela tua vontade,
Degradado pelo teu toque -
- Morto por ti.

Vivo por ti.

quarta-feira, abril 11

Vazio Rubro

Então acordei,
Sublime plenitude
Que se me apoderou,
Eras tu, tu e não mais!
O universo...eras tu!
Senti a vertigem,
Abracei a loucura,
Tornei-me não mais que uma sede de fogo.
E o fogo eras tu!
A chama eras tu!

Mas porquê? O toque fragmentou,
O sangue eras tu, reflexo da pureza...
Refracção do desejo...

Então, caído, te abracei,
Saudável memória cadavérica,
Inexistente, imperceptível,
Tão fictícia como aquele anjo caído dos meus sonhos,
Voando para longe,
Nunca meu, sempre em mim,
Abraçando o vazio desse tempo sem fim.
E eu, caído, te olhei,
Com a minha íris sufocante te fixei
Naquele momento de submissão.

E então me sorriste...
Sublime plenitude!
O universo...eras tu!

sábado, abril 7

Parte de "De mim para ti"

[...]

Porém te digo...tu,
No teu olhar errante,
Nessa tua essência impressionante
De jovial existência,
És capaz de moldar as nuvens,
Banhá-las de luz e calor,
Sufocar o dia de belo sabor,
Fazendo desvanecer a dor!


Um sorriso...
Rasgado, emocionado, apaixonado
Altera o Fado,
E as imagens escorrerão
Pelos teus olhos,
Fervilharão no teu sangue
Como um manto de felicidade
E bem-estar infindáveis.
É uma questão de acreditar.


E eu acredito em ti.
Pois eu sou tu,
E tu és eu,
No fundo, amantes incondicionais da vida.

Travessão

Queima, queima, queima, queima, finda-se no ar a perene falta de razões.
Porque nunca o vais alcançar.
Ponto final.

terça-feira, abril 3

Palavras cheias de nada

Foi ao descalçar a dor que surgiu afinal. A descrição é suja, lava a inutilidade transparecendo o que de facto se passa, a objectiva imagem de sangue derramado.
Não tem sentido... não tem sequer razão de ser...que quero dizer..?
...Feriram-me?
O comentário do punhal afiado foi abafado e seco, quase imperceptível. "Tu és ninguém, tu não tens sonhos".
Tenho sim, preparei-os ontem depois do jantar. Saí à rua era de manhã. O filme não era de sol, nem havia passarinhos a cantar, nem sorrisos a pairar, muito menos guiões cor-de-rosa. A sobremesa caiu naquele preciso momento...
Ahahahahah! Patética falta de estilo...partiste a postura seu corcunda!
Continuei a decompor, a postura, o maxilar, a maçã de Adão, o joelho direito e a hipófise. Todos se ajoelharam perante o teu atrevimento!
Tirei-te os sonhos.
Nunca os cheguei a ter. Desisti deles depois de os preparar.

segunda-feira, abril 2

Rasgo no Absurdo

" Desesperadamente ligado ao absurdo, o homem é prisioneiro de uma liberdade irredutível a qualquer apoio transcendente. Mas talvez aquela hostilidade do mundo seja a raiz de uma suprema reconciliação."


Nascer, viver, morrer.
Quebro quando procuro ilustrar uma eternidade sem ser, sem ter noção, consciência que não sou, que não vivo, que não penso. Uma eternidade, uma infinidade, um sem fim de segundos a estar em lado nenhum, no breu, na escuridão, que no fundo não é escuridão, por no fundo nada ser. É esse aperceber da falta de sentido na nossa existência, e todas as vezes que nos voltamos a diluir no rotineiro perdendo essa noção que haviamos ganho, que Albert Camus define como sendo o absurdo da existência ( «esta espessura e esta estranheza do mundo — é o absurdo» ).
Em "Le Mythe de Sisyphe, essair sur l’absurde" (O Mito de Sísifo, ensaio sobre o absurdo)
Camus expõe todos os seus ideais existencialistas, recorrendo ao exemplo de Sísifo, que encarna a inutilidade do esforço humano, ao ser condenado a empurrar, eternamente, um rochedo até ao cimo de uma montanha para voltar a deixá-lo cair e recomeçar tudo de novo.

Não pretendo nem expôr, nem analisar, nem palavrear o tema/livro de Camus. Deixo apenas uma boa sugestão de leitura, de uma leitura filosófica, crua, interessante, de todos e na qual eu me vejo dissecado.

Será porém este sentimento, este absurdo, que também é o meu, algo tão cruel e cinzento que nos faça perder a esperança e vontade de viver? Parafraseando Camus, a par da «fidelidade superior que nega os deuses e levanta os rochedos (...) [, porque sabe que] cada grão dessa pedra, cada estilhaço mineral dessa montanha cheia de noite, forma por si só um mundo. A própria luta para atingir os píncaros basta para encher um coração de homem. É preciso imaginar Sísifo feliz»